14.10.07

Por onde anda MANDA BALA?

Como diria o Xexéo, esta é a pergunta que não quer calar. Depois de vencer a competição de documentários e o prêmio de melhor fotografia de Sundance, o filme de Jason Kohn sobre corrupção política e violência urbana no Brasil já passou pelos festivais de Toronto e Vancouver, pelo European Film Market e estreou em agosto em circuito restrito nos EUA.

Por aqui, no entanto, um manto de silêncio caiu sobre o filme. Embora em janeiro a equipe planejasse exibi-lo em festivais brasileiros, MANDA BALA não apareceu no É Tudo Verdade, nem no Festival do Rio, nem virá para a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, que começa no dia 18. O pessoal do Festival do Rio bem que tentou incluí-lo na programação, mas deparou-se com a alegação de que MANDA BALA não pode ser exibido no Brasil por causa de um processo movido pelo deputado e ex-senador paraense Jader Barbalho. No filme, Jader é acusado de desviar dinheiro público para uma criação de rãs em nome da sua mulher.

Entre os que já viram o filme, há quem elogie o estilo à Errol Morris e a fotografia da curitibana Heloísa Passos. Mas há também quem critique as generalizações e o sensacionalismo de Jason Kohn. As cópias de MANDA BALA circulam no exterior com uma cartela inicial pespegada pela produção, que diz: "Este filme não é para ser exibido no Brasil". A afirmação ambígua trai uma intenção de baixo marketing, sugerindo ao mesmo tempo um banimento e uma presunção de gravidade.

O diretor já andou declarando que não quer mesmo que seu filme passe no país a que se refere e onde foi filmado. A razão? "Meu pai mora no Brasil e seria perigoso". Sendo assim, adensa-se o mistério. MANDA BALA está interditado ou deliberadamente negado ao público brasileiro?

Melhor, portanto, mudar a pergunta lá do título: "O que se esconde por trás de MANDA BALA?

A chamada do pôster resume a polêmica abordagem do filme: "Quando os ricos roubam dos pobres...os pobres roubam os ricos." Examinando a corrupção e o violento distanciamento social entre classes, Kohn analisa de forma independente as histórias de uma elite ameaçada por uma onda de seqüestros violentos e, em contrapartida, explorando a roubalheira perpetuada pelos altos escalões da sociedade, especialmente o caso do ranário de Jader Barbalho, acusado de desviar 9 milhões de dólares da SUDAM. Na entrevista a seguir, ele insinua problemas legais para a proibição.

Spoiler: O que o atraiu inicialmente à realização cinematográfica e como isso se desenvolveu ao longo de sua carreira?
Jason Kohn: Acho que, da mesma maneira que a maioria dos diretores, eu simplesmente amo filmes. A maior parte da minha vida eu imaginava que a “indústria” era esse lugar mágico acessível apenas aos sortudos, os brilhantes e aos super talentosos. Bem, após meu primeiro estágio de verão na universidade, trabalhando num filme independente de orçamento moderado, o Mágico de Oz revelou-se. A indústria era repleta de pessoas normais simplesmente trabalhando para se sustentarem. Descobri que, se eles podiam, eu também podia.

Spoiler: Existem outros aspectos da realização cinematográfica que você ainda gostaria de explorar?
Kohn: Estou ansioso para trabalhar com atores.

Spoiler: Fale da idéia de MANDA BALA . Como ela surgiu e se desenvolveu?
Kohn: Este projeto teve um início bastante humilde. Estava pesquisando uma história sobre um grupo de sem-terra revolucionários do Brasil que eu acreditava precisavam de uma nova imagem e de uma campanha de marketing de grande orçamento. Eu até desenhei storyboards para o que seriam anúncios de TV super estilizados. O filme seria uma sátira política, mas o projeto se tornara um pouco “na sua cara” demais. No entanto, quando eu estava pesquisando, acabei descobrindo duas outras histórias que eu achava serem mais sutis, mas que poderiam ser tão provocativas quanto, sem se tornarem tão didáticas sobre a luta de classes e tudo isso. Tudo começou como uma história de um criador de rãs no interior e um cirurgião plástico na cidade, dois homens no ápice de suas profissões, e a relação entre as duas especializações com os crimes à sua volta. É graças a uma série de conversas com um amigo que esta relação aparentemente amorfa se transformou na idéia de que este filme poderia ser sobre as formas como os ricos roubam dos pobres e os pobres roubam de volta dos ricos. Daí em diante, ficou mais fácil dizer às pessoas sobre o quê o filme se tratava. Recrutei um amigo, Joey Frank, para vir ao Brasil comigo e embarcar nessa aventura. Éramos jovens e tinhamos pouco a perder.

Spoiler: Quais foram os maiores desafios que você encarou durante a cencepção e produção?
Kohn: Quando se tem 23 anos, sem experiência alguma em produção e toma a decisão de trabalhar num filme com uma equipe numerosa, e especialmente em cinemascope, uma das minhas maiores preocupações era como conquistar o respeito da equipe. Temia que eles pensassem que eu não passasse de um jovem babaca americano privilegiado e que esse projeto seria nada mais do que um trabalho qualquer para eles. Ainda que isso seja um bocado ingênuo, eu queria que a equipe acreditasse no projeto e sentisse que eles faziam parte de algo especial. Heloisa Passos, nossa diretora de fotografia, compreendeu o que eu estava tentando fazer desde o início e seu entusiasmo ajudou a unir a equipe, e acredito que grande parte do motivo de nosso filme ter a aparência que tem é porque o trabalho duro da equipe se imprimiu na película. Heloísa me ensinou mais do que qualquer um sobre produção, ela foi minha escola de cinema e sua crença em mim construiu a auto-confiança necessária para completar o projeto quando a situação ficava difícil. Ainda não pude exibir o filme para a equipe e os problemas legais que nos impedem de exibir o filme no Brasil estão acabando comigo.

Spoiler: Quem são as influências criativas que tiveram maior impacto sobre você?
Kohn: À parte de cineastas como Errol Morris, Paul Verhoven, Frederick Wiseman, Terry Gilliam, Abbas Kiarostami, os irmãos Coen, Gaspar Noe e mais outros tantos incontáveis, [o polêmico DJ de rádio] Howard Stern provavelmente foi uma das grandes influências culturais da minha vida. Além de ser um dos artistas mais subestimados da minha geração – no mínimo – ele está engajado numa campanha para combater a hipocrisia na mídia e na política. Elas são vistas apenas como palavras de incitação em vários círculos sociais, mas Howard é um autêntico anti-elitista, ele não se importa com instituições autoritárias e essas qualidades foram as pedras fundamentais para “Manda Bala”.

Spoiler: Qual é sua definição de “cinema independente” e tal definição se transformou desde que você começou a filmar?
Kohn: Talvez o desafio principal ao dirigir “Manda Bala” tenha sido contra comprometer-se. E, na minha experiência, existem duas áreas nas quais esse conflito é possível: no roteiro e na produção. Quando narradores/diretores/produtores levantam seu próprio dinheiro para fazerem seus filmes, raramente eles precisam comprometer o conteúdo, e este é provavelmente o núcleo daquilo que é romanticamente chamado de “cinema independente”. Ao mesmo tempo, o cinema comercial, repleto de histórias clichês e personagens convencionais, oferece a vários diretores acesso aos mais vastos recursos de produção que permitem narrativas visuais das mais variadas, raramente conseguidas dentro do mundo independente. Seja comercial ou indie, tenho muita pouca tolerância a pretensão em ambos os extremos e me recuso a julgar um filme pelo orçamento. A esta altura, “indie” é um termo conveniente para o marketing.

Spoiler: Que conselho você compartilharia com cineastas iniciantes?
Kohn: Eu alertaria a qualquer um que esteja fazendo filmes para evitar a confusão entre a democracia do meio (que é infinita) e a democracia do processo (que é inexistente).

Spoiler: Qual a conquista em sua carreira de que você mais sente orgulho?
Kohn: Durante a maior parte da produção, o mantra de “Manda Bala” era: “sucesso é completude”. Terminar esse filme foi uma conquista tão monumental, já que poderia ter dado errado inúmeras vezes. Tudo depois disso foi sopa.

Da redação do O Globo e Zeta Filmes
Tradução: Bernardo Krivochein

Um comentário:

Anônimo disse...

Ouvi falar desse documentário em outros sites (como o Awards Daily), mas não dei muita importância. Contudo, vendo essa matéria há uns dias atrás percebi que pode ser um bom filme - só espero que seja exibido no Brasil, pois seria lamentável se isso não ocorresse.

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