3.3.08

A Concepção do Diretor de Arte


A "cara" de um filme é dada pelo diretor de arte, o encarregado pelo planejamento artístico de toda a produção. A concepção do storyboard, cenografia, luz e figurino são as principais tarefas desse profissional que usa as mais diversas ferramentas para elaborar seu projeto.

O ponto de partida do diretor de arte para desenvolver o trabalho é absorver o que se pretende com a realização do produto. A partir daí começa a maratona técnica para dar forma ao conteúdo.

O projeto tem início com o estudo do roteiro. "A situação ideal para desenvolver um bom trabalho de direção de arte é participar desde a elaboração do roteiro. Muitas das situações apresentadas são criadas pelo diretor de arte", considera o diretor de arte e artista plástico Luciano Angelini.


ETERNO AMOR

A definição do espaço onde a idéia será materializada é fundamental para a criação do projeto cenográfico. Conhecer a locação ou até projetar a construção do local onde ocorrerá a captação ou se desenrolará o evento envolve o conhecimento dos dados contidos na planta baixa do espaço - como pé-direito, localização e altura das varas e grids e existência de passarelas ou fosso, que eventualmente poderão ser utilizadas na criação dos cenários, adereços, figurino, iluminação e planejamento de cores - ou a elaboração de um projeto com todos estes requisitos.

Nos storyboards estarão definidos os planos de captação, a visão e a circulação dos participantes de um evento, o posicionamento de câmeras, luzes, objetos cenográficos e artistas na cena. Atualmente, tem sido grande a importância dada à execução do storyboard para facilitar e agilizar o trabalho do diretor de cena. Dessa forma menos tempo é consumido em ensaios e repetições dos takes, evitando-se o desperdício de tempo e dinheiro em tempos de orçamentos apertados.

Com a aprovação dos planos visuais da produção, que inclui as texturas que serão empregadas, efeitos na pintura, elementos que irão compor o plano e objetos de cena, entram em campo o produtor de design e os cenotécnicos (serralheiros, pintores, marceneiros), que irão efetivamente pôr a mão na massa, para concretizar a obra.


CLÃ DAS ADAGAS VOADORAS

Luis Rossi, diretor de arte e cenógrafo de longas como MEMÓRIAS PÓSTUMAS, DOIS CORREOS, A HORA MÁGICA, dentre outros, diz ser muito comum no Brasil o diretor de arte acumular também a função de desenhista de produção. Para ele, é importante que o diretor de arte tenha pelo menos fundamentos sobre iluminação cênica, seja em estúdio ou teatro.

"Um ponto de luz no teatro representa muita coisa, enquanto no cinema este ponto de luz tem de ser ampliado. No teatro, uma vela acesa ilumina o rosto de um ator e representa todo um universo; no cinema isso já não acontece. Você pode até conseguir um resultado, mas fotograficamente falando é muito mais difícil, na verdade você vai representar um ponto de vela."

Ao conceber os espaços, Rossi esboça à mão e, somente com o projeto finalizado, isto é, com as informações detalhadas sobre o plano visual da produção, é que o desenha digitalmente. A explicação para isso são as inúmeras modificações no projeto durante as reuniões com o diretor e sua pouca familiaridade com o meio digital: "No papel é mais rápido. Sou das antigas", explica.


A PAIXÃO DE CRISTO

A utilização de maquetes para o planejamento da construção de um cenário em estúdio, assim como o esboço em papel, estão sendo, atualmente, substituídos pela modelagem em softwares de imagens tridimensionais. Rossi, no entanto, afirma não abrir mão da maquete pois, ainda que a imagem saia tridimensional no papel, continua sendo uma imagem chapada: "Eu não posso por a mão dentro".

Luciano Angelini, ao contrário, prefere as ferramentas digitais como o Light Wave, Strata e Animation Master (para animação); Vector Works e Art Lantis (para arquitetura e cenografia), para realizar e apresentar seus projetos. "Hoje até um cenógrafo tem de estar interado sobre tecnologia digital, pois precisa estar preparado para montar ambientes onde serão usados efeitos digitais ou cenários virtuais."

"Em termos de direção de arte, nada se concebe no set de filmagem. No set o conceito já está estabelecido. Eventualmente o diretor pode sugerir: ‘Vamos concentrar mais isso daqui’, ou ‘Preciso de um primeiro plano aqui’, então preciso ter elementos na manga para o caso de precisar deles. Tudo pode ir para lá ou para cá, mas nada irá modificar o conceito", diz Rossi.


O FANTASMA DA ÓPERA

Quando Rossi entrou na televisão, em 1977, usavam-se muitos recursos do teatro: tanto a interpretação dos atores quanto as técnicas cenográficas eram teatrais. Como ainda existiam televisores preto e branco, a preocupação com as tonalidades das cores se fazia necessária, pois algumas cores como o vermelho e o preto imprimiam da mesma forma em P&B. "Eu nunca falei: vou ser diretor de arte. Comecei a fazer teatro no interior, como ator. Fiz dez anos de teatro amador e foi quando desenvolvi diversas habilidades, como atuar, dirigir, fazer iluminação, figurino e cenário. Vim para São Paulo fazer a Escola de Arte Dramática (EAD-USP) e casualmente fui convidado para ser assistente do Serroni na TV Cultura. Lá eu aprendi fazendo. Então passei para a televisão comercial, trabalhando como cenógrafo. Comecei com "Os imigrantes", uma novela que durou dois anos e foi uma grande escola, pois ela se passa em um período que durou cem anos. Pesquisei um século de Brasil e tinha de pesquisar hoje para executar o cenário amanhã. Depois fiquei fazendo por dez anos carnaval, sete como carnavalesco, e nesse meio tempo também fiz teatro e comercial. Eu não sou um especialista em direção de arte ou especialista em objetos. Às vezes me chamam de mago, pois faço de tudo: figurino, cenário etc. Eu não tenho o perfil de diretor de arte que trabalha em prancheta. Eu pego no batente, eu executo, eu ensino a executar. Eu tenho o lado do aderecista, do pintor de arte", conta Rossi.

A história de Luciano Angelini é completamente diferente. Foram seus trabalhos como artista plástico que o levaram a se tornar um diretor de arte a partir de 1990. Ele considera ainda que sua formação acadêmica e profissional em Engenharia Civil (FAAP) ajuda bastante no desenvolvimento de projetos cênicos. "Fica mais fácil projetar o espaço tendo pré-conhecimento das técnicas de como ele deverá (e poderá) ser construído." Elementos pictóricos não são nenhum mistério para alguém acostumado a lidar com pincéis, telas, tintas, cores e texturas. Por isso, há mais de dez anos, Angelini resolveu complementar seus conhecimentos estudando iluminação, técnicas de edição e informática. "Uni o útil ao agradável." E completa: "Na direção de arte de um evento posso dar asas à imaginação pois participo, inclusive, da criação do projeto que será apresentado para a empresa. Aí é arregaçar as mangas e usar tudo que a tecnologia oferece para prender a atenção dos participantes durante as apresentações, palestras e shows que integram o projeto".


O AVIADOR

Rossi sente-se mais confortável fazendo direção de arte para cinema. "Você tem mais liberdade. Na TV, e aí estou falando de publicidade, é o cliente quem manda. Você perde o domínio, porque você tem de vender o produto. Então eu chego, com todas as minhas idéias maravilhosas e o diretor fala: ‘Não! É só um plano fechado. Aqui eu só quero a reação do ator’. Aí resta um fundinho e você vai ter de fechar a sua criação neste fundinho. No cinema não, você tem de vender uma idéia e uma história que você concebeu, então tudo tem mais significado e aquilo é um todo com começo, meio e fim. O foco não está no produto, está no ser humano. Devido ao cinema ser mais denso e do espectador registrar com mais atenção a imagem, o produtor de design ou diretor de arte tem um papel muito mais acentuado do que na televisão. O cinema é muito mais realista do que o teatro. O cinema tem de ser hipernaturalista. O teatro é muito mais fake porque um pudim, por exemplo, pode ser feito de papel machê, já que está longe da platéia. No cinema, o pudim tem de ser pudim. Não dá para se fazer um mock-up de pudim, a não ser que seja muito bem feito."

Enfim, para trabalhar em direção de arte, é preciso ter a arte de misturar métodos, estilos e background na hora de dar a identidade visual a uma obra cênica.

Por Alessandra Meleiro (Tela Viva)

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